Padecimento noturno da criação poética

Não me vem o sono que tanto preciso, que me deixe curar meu estresse. Mesmo que eu não durma, fecho os olhos e sonho como pudesse me confortar, afagar minha angústia, minha grande e sólida solidão. Sonho que um dia viver será prazeroso, que um dia me orgulharei desse estilo nefando de vida. São duas horas e não me vem o sono que tanto preciso, que não me deixe ficar acordado, com goteiras intermitentes nos olhos, com uma tensão nos músculos da face, doídos, incrivelmente mórbidos e expressivos, como que contraídos no reflexo do espanto. Noites se tornam dias sem dormir – melancolia. Dias se tornam noites mal dormidas – de correria. O cansaço se acumula até que entorne dos meus olhos uma gota de vela do desprazer da vida do meu mundo sem mares nem continentes; um mundo árido, inóspito, inconseqüente, intrínseco, advindo do meu pensamento. O silêncio – faço de tudo, evitando que me contagie. Ouço música; não estou mais no silêncio, mas permaneço em silêncio. Escolho então as músicas mais melancólicas até que descubro que falo em voz alta e falo sozinho. Agora me levo à loucura... Acaricio-me com minhas próprias mãos, mas não percebo o carinho que recebo; percebo só o que dôo. Ocorre que não recebo gratidão nem recompensa. Fico então desolado nesse meu decalque de poeta alcoólatra e suicida, acendendo um cigarro com a brasa do outro, jogando as pontas ainda acesas no chão, espalhando as cinzas fétidas, transformando o piso do meu quarto num brasido dos meus sonhos execráveis.

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